Oi, Cris.
Pergunta respondida, muito obrigado!
Primeiro, devo dizer que sua postagem ficou muito bonita. Pelo que você disse e pelos dizeres que você trouxe para ela.
Quanto à sua experiência com o livro "pena quebrada", penso que isso ocorre comigo também. Com ilustrações? Sim, mas muito mais com o texto: como se meus olhos botassem a linha narrativa do texto na frente das imagens. O que me parece uma incongruência. Essa questão das duas narrativas (pelo menos duas, como você apontou) presentes numa história é muito pertinente. A ilustração, por vezes, não é uma narrativa paralela à textual, mas sim um pedaço dela, parte indissociável. Um exemplo que sempre me ocorre é 'Flicts', do Ziraldo. É um clássico, bem provável que você o conheça. O bom texto pode ser muito imagético, mas um caso como o de Flicts (que conta a história de uma cor, uma cor desconhecida, que ao longo do livro se descobre), cujo personagem é, aparentemente, uma cor nova, não há texto com força para montar essa imagem. O que é esse livro sem os desenhos? Simplesmente não existe.
Parece uma incongruência, um pecado, aquilo que eu disse de dar uma "prioridade" ao texto, ainda mais se pensarmos na dependência que há entre elas (na maioria dos livros). Mas é o que costuma ocorrer. É bem o que vc disse: o modo de se aproximar de um livro. Reconheço a importância das imagens, sinto quando ela dialoga com o texto, ou quando ela toma um outro rumo dele: uma nova linha. Gosto muito de narrativas visuais. Mas (e foi isso que apontei pra você) frequentemente não me ocorre nada mais do que adjetivos (ilustração bonita, desenhos bem feitos, etc) para descrever o que achei da narrativa que os desenhos contam num certo livro. Como se eu sentisse a linguagem, mas não soubesse explicá-la. Continuo achando que é uma questão de sensibilidade, de se abrir mais para a percepção das imagens. talvez eu precise fazer mais exercíciso para o olhar, como sua professora fez com Monet, rs. Não é verdade que a gente¹ é vidrado no texto? Quando digo a gente, falo da maioria, sempre tão centrada em textos disso, textos daquilo, mas incapazes de reparar numa placa engraçada na rua, ou um detalhe delicado da fotografia de um filme. Aliás, creio que estou complicando o que não deve ser complicado. Afinal, perder-se em elucubrações sobre jeitos de se ler uma história é se perder delas, sempre tão simples... pra quem se dispõe a acompanhá-las.
E falando em beleza e simplicidade, ah, você citou a regina machado. Pois estou lendo um livro dela, sobre contação de histórias (e, ah, sou um contador com pouquíssima experiência, PLZ!), no qual ela fala justamente disso... de como o contador 'conquista' e é conquistado por uma 'história', um jogo duplo, que a regina descreve com muita beleza. fala de um bosque (que ela vê na altura do peito) no qual uma história entra, onde o contador a internaliza. Achei essa imagem muito bonita, a do bosque, e bom que você a recordou. A maioria dos textos (placas, jornais, revistas, romances ruins que não mexem com o leitor, conversas banais, artigos) não chega até lá, pois deciframos sem qualquer trabalho, sem fruição, suas mensagens. Mas uma história é muito mais do que uma mensagem a ser decifrada: uma história bem escrita ou bem contada envereda por dentro da gente (e a gente envereda por ela) e deságua no bosque, que alguns chamam só de coração mesmo. E se pensarmos que cada um tem um bosque diferente (bagagens...), com mais ou menos árvores, com mais ou menos arbustos, com galhos, cipós, folhagens densas ou não, se embarcarmos nessa metáfora da regina, chegamos à ideia de que cada história chega de um jeito ao bosque de uma pessoa. muito linda, essa fala da regina. e que ótimo deve ter sido essa oficina com ela, hein!
Voltando para as ilustrações, penso que tudo pode ser sintetizado por sua última frase: o sentido está no olhar de quem se dispõe a ler. Até porquê², um livro que dá um sentido único, que o leitor precisa achar, é automaticamente um péssimo livro. Isso vai contra a ideia de bosque criada pela regina. Aliás, isso me lembrou que larguei esse livro há alguns dias para ler uns contos e desde então não peguei mais nele. vê se pode! Hoje retomo, talvez.
Agradeço novamente sua atenciosa postagem. E bom que perguntei.
Abraço!
Nota:
¹ Se você me permite uma nota de pouca importância, aqui digo que costumo usar a expresão "a gente", "os brasileiros", generalizo mesmo, ainda que saiba (é óbvio!) das muitas exceções que essa expressão não leva em conta. Muita gente critica isso, inclusive alguns linguistas, mas acho bobagem, e talvez use "a gente" mais por cisma do que necessidade.
² Permita, então, uma segunda nota. Ainda mais sem importância, pois gramatical. Costumo pensar a regra do 'porque/por que' assim: 1- com sentido de 'pois' - porque. 2- com sentido de 'pela razão, pelo jeito, pelo motivo, pela ocasião, etc' - por que . E agora, e essa expressão mais da fala do que da escrita (até porque), é separado ou junto? tem acento? Não responda. Eu poderia mudar a frase, mas um dos cacoetes que tenho é manter as dúvidas gramaticais e depois ficar divagando sobre elas. sei lá por quê.
já fui fuçar o blog de mcris. e adorei essa primeira troca de cartas-virtuais!
ResponderExcluirisso de pensar as imagens, as narrativas visuais e as que também apresentam texto-quase-que-dependente-de-imagens é algo muito importante na literatura. cada vez mais.
já tô esperando novas trocas aqui :)
abraços.
:)
ResponderExcluirvisite-o! bonito espaço.
Sim, divagar. Passear. Tomar bastante cuidado para se perder e assim fazer valer o passeio...
ResponderExcluirComo é saber que tem alguém te seguindo?
.
thanx
a
lot
!
.
!
ResponderExcluirOi!
ResponderExcluirMais coisas vão se destacando no seu texto, conforme o tempo passa. Fiquei pensando no Ziraldo, por exemplo. Em Flicts ele fala de algo (uma cor nova, completamente desconhecida) que na verdade não pode ser representado nem por palavras nem por imagens visuais! Então ele deve estar falando justamente dos limites dessas duas linguagens...
Já a reflexões da Regina Machado, que você acompanha [1], fazem pensar na oposição, no contraste (será que a gente pode se arriscar a dizer: 'na dialética'?) entre VER e OUVIR, entre ESPAÇO e TEMPO, HORIZONTAL e VERTICAL, entre um olhar ABRANGENTE e um outro, PROFUNDO...
O que você está dizendo, acho, é que aprender a ler é educar os sentidos, afinar as sensibilidades -- sempre no plural. E que o descompasso entre os diversos sentidos, entre as várias sensibilidades, é o que dá o toque pessoal de cada um...
Um belo pensamento!
Um abraço e desculpe qualquer coisa.
[1] (olha a notinha aqui também!) Pensei em dizer: "que você acompanha, encantado" e me lembrei de uma canção lindíssima do Chico Buarque. Vê se não é a cara do seu encantamento com as histórias: http://www.youtube.com/watch?v=anFxDsg20KE
Oi, Cris..
ResponderExcluiramei a música do Chico. Sabe que não conhecia?
E obrigado. Se pareci encantado pelas histórias, então é porque consegui passar o amor que tenho por elas pra postagem. isso é bom! :)
E muito legal sua leitura... a questão do Flicts faz todo sentido! é um livro bem-escrito, especial. Natural que dê vazão a tantas ideias.
E pertinente sua fala sobre a regina (que encantou tbém a vc, vejo bem).. a fala dela não para no simples-dito: suas imagens nos permitem ir adiante. acho que fizemos um pouco disso por aqui. bjo, e obrigado pelas visitas atenciosas!